domingo, 6 de março de 2016

Editorial: jornalismo, sempre, de qualidade


Notícia reforça a convicção de uma constante melhora da mídia nacional

O conglomerado das Organizações A Primeira Vítima vem a público afirmar o total apoio à nobre iniciativa do Tribunal Superior Elogioso (TSEl) de contratar de forma transparente, democrática e mui criteriosa, jornalistas para engrossarem o time de excelentes profissionais do setor de comunicação da corte, que, ressalta-se, não tem fins lucrativos, aparentemente.

Somente uma visão despida de preconceitos é capaz de observar, com lágrimas nos olhos, como o belo exemplo poderia muito bem guiar todos os demais órgãos da república. Contratar agentes de comunicação por meio de ilibadas empresas de limpeza está na mais refinada vanguarda na busca incessante – norte também deste noticioso, diga-se – de um fazer-jornalístico-de-qualidade.

A sofisticada lógica da já costumeira iniciativa do TSEl, iniciada em 2009, tem tudo a ver. Empresas de quais ramos seriam as mais bem preparadas para fazer a faxina onde quer que seja? Hein? Hein? Respondam aí, vai. Num sabem, né? Empresas de limpeza, tolinhos.

O conglomerado expressa também sua total satisfação em revelar que os profissionais contratados passaram por extensivo, exaustivo e exigente (queria enfileiras três adjetivos iniciados por ex) curso de qualificação na Universidade A Primeira Vítima (UAPV), reconhecida por todas as institucionais de ponta como a número 0 na formação de excelentes comunicadores.

Enfim, essa merda que a tribunal fez a gente achou da hora. Abaixo, as matérias veiculadas neste domingo (6) que deram inspiração para esse nosso editorial supimpinha. 

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Superior Eleitoral contrata jornalistas por empresa de limpeza

FREDERICO VASCONCELOS
DE SÃO PAULO
06/03/2016 02h00

O TSE (Tribunal Superior Eleitoral) contratou 14 jornalistas para reforçar a assessoria de imprensa nas eleições municipais deste ano. Os profissionais usarão crachá fornecido pelo tribunal, mas o empregador real é uma empresa de limpeza que faz locação de mão de obra temporária na área de serviços gerais.

A Liderança Limpeza e Conservação Ltda., com sede em Santa Catarina, receberá R$ 2 milhões para prestar "serviços especializados na área de comunicação social" no período eleitoral.

Um total de oito redatores e dois fotógrafos terceirizados atuarão no TSE ao longo de 12 meses.

Além disso, outros três redatores e um fotógrafo ocuparão quatro vagas temporárias, de 90 dias, no "núcleo cobertura das eleições".

O primeiro turno das eleições municipais está marcado para o dia 2 de outubro; o segundo turno será no dia 30 do mesmo mês.

Os salários variam entre R$ 6.300 e R$ 6.700, fora encargos. Os valores estão acima dos sugeridos pelo Sindicato dos Jornalistas do Distrito Federal para órgãos federais que terceirizam esses serviços.

A Liderança ofereceu o preço mais baixo em pregão eletrônico, disputando com nove concorrentes –seis dos quais pertencentes à área de comunicação.

"Esse modelo de contratação, pelo menor preço, limita a capacidade estratégica de atendimento", diz Carlos Henrique Carvalho, presidente da Associação Brasileira das Agências de Comunicação (Abracom).

"A comunicação tem que ser mais ampla, com atualização tecnológica, e não apenas preencher postos e oferecer um produtor de releases", afirma.

A Abracom defende a modalidade de licitação que avalia a melhor técnica pelo menor preço.

O pregão eletrônico tem previsão legal, e a terceirização de jornalistas costuma ser adotada por órgãos públicos nos Três Poderes. 

PRECEDENTE 
Em 2009, o STF (Supremo Tribunal Federal) contratou por R$ 660 mil a empresa Assemp Limpeza e Conservação de Imóveis Ltda., com sede em Lauro de Freitas, na Bahia, "para prestação de serviços de jornalista".

Quatro anos depois, o STF teve prejuízo de R$ 20 milhões ao assumir o pagamento de centenas de funcionários terceirizados em várias áreas. Sete contratos com a Assemp foram rompidos. A empresa alegou dificuldades financeiras.

A Assemp listava como clientes em seu site, além do Supremo, a Advocacia Geral da União, o Conselho Nacional de Justiça, a Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) e o Banco do Brasil. 

ENTRE AS MAIORES 
Não é esse o caso da Liderança, que começou a operar em 1995 e registrava capital social de R$ 3,5 milhões em 2011.

Em 2015, foi incluída entre as mil maiores empresas do país no ranking da revista "Exame" (na 967ª posição), com receita líquida de R$ 470 milhões, 23 mil funcionários terceirizados e cerca de 700 clientes.

Os sócios da empresa são o empresário Francisco Lopes de Aguiar, um cearense de Quixadá que foi responsável pelo setor de pessoal numa empresa da construção, e sua mulher, Gilvana Meri Belegante. 

Aguiar já foi entrevistado pela revista "Forbes", em edição especial "com o ranking dos bilionários do mundo e suas histórias" –segundo informativo da empresa– e convidado a dar palestra em congresso de prestadores de serviços em Nova York (EUA).

Entre as atividades que a Liderança explora estão serviços variados, como limpeza urbana e predial, jardinagem, motoristas, segurança patrimonial, desratização, recepção, telefonia, serviços penitenciários, manipulação de valores e inspeção de passageiros e tripulantes em aeroportos.

A empresa também prestou serviços ao Tribunal Regional Eleitoral de Santa Catarina (que exige, como critério para contratação de jornalistas, que não sejam filiados a partidos políticos).

Em 2011, firmou acordo coletivo de trabalho com o Sindicato dos Jornalistas Profissionais de Mato Grosso do Sul, envolvendo os empregados lotados na assessoria de comunicação da TV Universitária. 

IMPUGNAÇÃO 
Em 2015, o Tribunal de Contas da União (TCU) rejeitou o pedido de impugnação do contrato da Liderança com o Ministério do Meio Ambiente, para prestar serviços de assessoria de imprensa no valor total de R$ 3,9 milhões.

A Abracom alegou que o ramo de atividade da Liderança seria incompatível com a finalidade da contratação pelo ministério.

O TCU reconheceu que a principal atividade econômica da firma é de limpeza em prédios e domicílios, mas aceitou a alteração contratual da empresa, que incluiu no rol dos objetivos sociais "os serviços de jornalistas".

O Sindicato dos Jornalistas do Distrito Federal entende que o ideal é admitir profissionais mediante concurso público.

"Não sendo possível, que ao menos sejam contratadas empresas da área de comunicação", afirma Jonas Valente, coordenador-geral da entidade.

"Mesmo que os salários não sejam discrepantes, o problema é que muitos editais não garantem o cumprimento das exigências legais", diz Valente.


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OUTRO LADO 
O Tribunal Superior Eleitoral não comentou a contratação da Liderança Limpeza e Conservação Ltda para serviços de jornalismo.

Consultada na quinta-feira (3), a empresa informou que o diretor-presidente, Francisco Lopes de Aguiar, estava viajando.

Até a conclusão desta edição, Aguiar não havia respondido o questionário enviado pela reportagem.

O TSE publicou no edital justificativas para a terceirização do serviço de jornalistas.

Segundo o tribunal, "justifica-se a utilização da sistemática de contratação de postos de trabalho para os serviços de comunicação social em razão da dificuldade de mensurar, detalhar e quantificar, ou mesmo adotar índices de medição dos resultados de tais atividades regulares com o objetivo de faturamento dos serviços pela contratada, bem como atender demandas emergenciais e intempestivas".

A Assessoria de Imprensa e Comunicação Social informa que o nível salarial atualmente pago aos terceirizados "tem como objetivo preservar os padrões de qualidade", além de o trabalho a ser realizado "requisitar não apenas conhecimentos jornalísticos, como noções de Direito Constitucional e Eleitoral, e conhecimentos de informática".

Os jornalistas contratados atendem a imprensa externa e participam de reuniões de pauta. Também produzem matérias e notícias na internet e intranet do tribunal, bem como atuam no atendimento diário à imprensa e na elaboração de pesquisas de informações e dados estatísticos para jornalistas e autoridades do TSE.

A assessoria "entende ser relevante a contratação dos citados serviços, com o intuito de contribuir, também, para o desenvolvimento do exercício da cidadania e propiciar maior informação ao cidadão para o exercício do voto".

 

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